Em meio à preparação para o Natal, Helena, uma criança curiosa, assistia em casa a um programa de culinária, com o renomado chef Alex Atala, que apresentava uma receita de peixe assado – prato típico da ceia natalina de sua família. O episódio termina, mas o prato natalino apresentado pelo chef permanece na sua memória.
Ao ir até a cozinha, vê a mãe, Alice, preparando também um peixe para a ceia da família. Helena observa tudo com atenção, mas estranha algo: a mãe corta a cabeça e o rabo do peixe antes de colocá-lo para assar. Ela relembra os outros Natais e percebe que essa receita tradicional da família “sempre foi assim”. Nesse instante, a lembrança do peixe inteiro, preparado de forma diferente pelo chef Alex Atala, ressurge em sua mente, reforçando ainda mais sua curiosidade sobre o motivo daquele costume da mãe.
– Mamãe, por que você corta a cabeça e o rabo do peixe? – pergunta Helena, curiosa.
– Porque assim fica mais gostoso, filha! – responde a mãe, sem hesitar.
– Mas por que desse jeito fica mais gostoso? – insiste Helena.
– Sempre fiz assim. Sempre foi assim. Aprendi com a vovó! – conclui a mãe, encerrando a conversa.
Helena franze a testa. Reflete sobre a forma de fazer – afinal, o que viu no programa era diferente e parecia funcionar tão bem. Decide então perguntar à avó que estava no quintal:
– Vovó, por que a senhora corta a cabeça e o rabo do peixe na nossa receita tradicional de família?
– Ah, minha netinha… quando eu fazia essa receita, a família já era grande e a forma não era do tamanho suficiente. Então, para caber, sempre precisava cortar.
Helena compreende, enfim: aquele costume não tinha relação com o sabor ou com alguma efetividade culinária, mas era, sim, uma limitação concreta de outra época, uma forma pequena. A prática seguiu sendo repetida, mesmo depois que a limitação deixou de existir. Naquela situação, ela entendeu que, ao descobrir por que fazemos e para que fazemos, nos tornamos capazes de reinventar o como fazer.
Quantos dos nossos hábitos institucionais, costumes burocráticos e procedimentos normatizados – muitas vezes sem efetivo interesse público – seguem sendo repetidos simplesmente porque “sempre foi assim”? Um “como fazer” que está incompatibilizado com a conjuntura, desafios e oportunidades do momento presente.